De Joe Sacco
272 páginas
Quadrinhos na Cia. | 2024
Tradução: André Czarnobai
Joe Sacco costura mais uma reportagem de fôlego em Pagar a Terra, enquanto se debruça sobre a história dos indígenas Dene no Canadá. São dezenas de fontes e uma imersão que nos leva a conhecer povos ameaçados por um ciclo de exploração, aculturação e violência. Ao longo de quase 300 páginas, o jornalista contextualiza, se aprofunda e dá múltiplas faces para uma questão complexa, que não se resume à realidade atual.
Vivendo em comunidade, conforme sua cultura ancestral, a história dos Dene ecoa à de muitos povos originários, não apenas na América do Norte. Seu modo de vida e tradições parecem incompatíveis com o sistema capitalista e sua sede por recursos. Ou, para alguns, incompatíveis com o progresso. O que Joe Sacco expõe, de modo documental, é como tudo o que esses indígenas vivem hoje está relacionado a uma rede de eventos, à medida que sua cultura foi subjugada pelos brancos, seus direitos negligenciados e sua relação com a terra ignorada. O jornalista amarra um depoimento no outro, cria pontes narrativas e, como de costume, se insere na apuração.
Durante o curso da trama, Sacco busca ser didático, mas ainda deixa o leitor tirar suas próprias conclusões. Há momentos em que pode parecer que a história se tornará repetitiva, mas somos surpreendidos pelo modo como a narrativa não linear é construída. Isso acontece especialmente no capítulo em que o autor se dedica a revelar como o sistema das escolas residenciais indígenas, comandadas por igrejas cristãs, desencadeou uma série de traumas que ainda influenciam a situação dos Dene.
Mesmo que mais econômico nas palavras do que no clássico Palestina, Joe Sacco ainda precisa se apoiar muito no texto para o desenvolvimento de sua obra. De todo modo, as informações são distribuídas com fluidez, com painéis elaborados com esmero.
Publicado pela Quadrinhos na Cia., Pagar a Terra entrega o que se espera de uma boa reportagem e parece fazer tudo isso sem esforço. A complexidade do assunto é respeitada e a experiência de Joe Sacco é mais uma vez comprovada. É impossível sair indiferente de tudo o que exposto na HQ, que reflete um pouco da história do mundo quando pensamos em relações coloniais.