Na França, grandes personalidades da história do país estão enterradas no Panthéon, em Paris. No mausoléu é possível visitar túmulos de figuras da resistência, filósofos, cintistas, escritores e outros nomes históricos. Alexandre Dumas, Victor Hugo, Marie Curie, Jean-Jacques Rousseau e Simone Veil são alguns exemplos.
Onde Goscinny entra nessa história?
Benoît Peeters, coautor da série “Les Cités Obscures” (inédita no Brasil, roteiro de Peeters e arte de François Schuiten) e grande estudioso da 9º arte, comentou em uma entrevista ao jornal francês Libération, sobre a legitimação dos quadrinhos e o caminho que falta ser percorrido. Segundo Peeters, essa legitimação avançou nas últimas décadas, mas ainda falta conquistar espaços, começando pela imprensa tradicional.
“Quadrinhos e mangás representam 25% do mercado editorial (na França) em proporções próximas à literatura geral. O que está longe de ser o caso de seu espaço na imprensa, basta olhar para as páginas do Le Monte, Libération ou dos semanários”, aponta na entrevista.
Contribui para a linha de raciocínio de Peeters, o fato de que, em 2022, o livro mais vendido na França foi um quadrinho. Le Monde Sans Fin (no Brasil, O Mundo Sem Fim, com publicação prevista para junho, pela editora Nemo), de Jean-Marc Jancovici e Christophe Blain, vendeu 514 mil cópias no ano passado, só na França. A obra, que fala sobre as mudanças climáticas que o planeta vive, as consequências disso e o que poderia ser feito para mudar esse cenário, mobilizou a opinião pública pela forma acessível e didática de discutir a temática. A previsão é que em 2023, as vendas se mantenham.
“Não se pode contar a história do desenho no século XX ignorando os quadrinhos”, diz Peeters.
E assim chegamos a René Goscinny
Na entrevista, Benoît Peeters também defende a ida dos restos mortais de René Goscinny (1926-1977), o criador de Asterix (ao lado de Albert Uderzo) para o Panthéon. Para ele, o quadrinista e os quadrinhos merecem esse reconhecimento, tendo em vista sua importância para a França.
“Goscinny é uma figura maravilhosa, porque retrata uma França totalmente aberta, vinda de todos os lugares, e ao mesmo tempo criou uma série de histórias emblemáticas. Seria um belo símbolo (tê-lo no Pantheon) e os símbolos são muito importantes”, reforça Peeters.
Mesmo que esse não seja um movimento amplamente discutido na França, a ida dos restos mortais de Goscinny para o Panthéon seria um movimento de legitimação de uma mídia que tem tido crescimento contínuo no mercado editorial francês. Seria o reconhecimento do papel para a França do criador de Asterix (além de ter contribuído em obras como Lucky Luke), uma HQ traduzida para mais de 120 línguas e que, sem dúvidas, faz parte do panteão dos quadrinhos mundiais.