De Osamu Tezuka
588 páginas
Pipoca & Nanquim | 2022
Tradução: Drik Sada
MW poderia ser resumido a quase 600 páginas alucinantes de perversão moral. Mas a obra mais sombria de Osamu Tezuka é muito mais do que isso. Assim como em Ayako ou O Livro dos Insetos Humanos, nesta história o mangaká não tem medo de trazer personagens torpes e tocar em temas muito polêmicos para o Japão da época (a obra começou a ser publicada em 1976) e até hoje.
A trama é centrada em Michio Yuki, um homem inescrupuloso, que quando criança foi exposto ao MW, um gás letal que matou toda a população de uma ilha. Mesmo que tenha saído ileso, Yuki se tornou um psicopata sem qualquer traço de remorso ou empatia. Seu comportamento vai desde usar as pessoas que aparecem em sua vida até sequestros, violência sexual e mortes. Além de uma habilidade incrível de se disfarçar, transitando com tranquilidade entre os gêneros masculino e feminino. Ele divide o protagonismo com o padre Garai, que tem uma ligação íntima e emocional com Yuki, apesar de o relacionamento dos dois parecer um pecado, aos olhos da Igreja.
Além de toda a questão que envolve a homossexualidade dos personagens, e que pode ser vista até de maneira controversa no quadrinho, Tezuka trata de temas como o uso de armas químicas pelo governo dos Estados Unidos, algo que havia ocorrido havia pouco tempo, no Vietnã; a corrupção em várias esferas da sociedade; além da origem de todo o comportamento de Yuki.Seria ele um psicopata porque foi exposto ao MW? Seria o padre Garai moralmente superior a ele?
Isso tudo se funde a um enredo de filme de ação, com direito a muitas reviravoltas, situações mirabolantes e exageros. Sim, há soluções completamente improváveis, que levam ao extremo nossa suspensão de descrença, assim como os papéis femininos sempre muito subservientes. Ainda que os pontos positivos se sobreponham aos negativos.
Pesado e sem pudores, inclusive no visual, MW é uma leitura que mostra o quão talentoso e versátil era Tezuka, e como usou suas obras como forma de expressar suas crenças e críticas.