De Paco Roca
176 páginas
Devir | 2022
Tradução: Jana Bianchi
Pode até parecer um exagero os muitos elogios a Paco Roca. O quadrinista espanhol foi praticamente uma unanimidade com suas duas obras publicadas no Brasil, Rugas e A Casa. Regresso ao Éden, recém-lançado pela Devir, provoca uma reação semelhante. Roca é um contador de histórias gráficas como poucos, costurando uma narrativa que sabe muito bem conquistar o leitor.
Se A Casa era focada em seu pai, Roca agora fala de sua mãe, Antonia, ao trazer em Regresso ao Éden um mergulho em sua infância e juventude, através de uma fotografia de família, tirada na praia de Nazaret, em Valência. Memória é, sem sombra de dúvidas, a palavra definidora dos trabalhos do quadrinista.
Antonia cresceu em uma Espanha arrasada pela miséria do pós-guerra, pela ditadura franquista e pelos costumes conservadores da primeira metade do século XX. Desde pequena, foi educada para servir, para aceitar seu lugar na hierarquia social e entender que, futuramente, sua obediência seria recompensada nos céus. Roca expõe uma vida dura, que em muito se assemelha com as histórias de nossas mães e avós, que não estavam no mesmo país, mas sofreram com dilemas semelhantes.
O que encanta em Regresso ao Éden é como o quadrinista espanhol esmiúça as vidas de sua mãe, tios e avós. Ele dá a essas histórias contexto, abraça elementos externos ao enredo, para enriquecê-lo, como é o caso dos relatos bíblicos que encantavam a mãe, ainda menina. Essa trama é tão bem contada, porque Roca pensa os enquadramentos, as cenas de detalhe, os silêncios, flashbacks e flashfowards, o uso das cores. É uma delícia ler Regresso ao Éden, e é difícil não terminar a HQ encantados com o que vimos ali.
É curioso pensar como, com três quadrinhos seguindo a mesma temática, Paco Roca ainda não nos pareceu repetitivo. Mesmo que ele siga determinado assunto, suas obras têm uma característica universal. Criamos paralelos e nos sentimos íntimos de seus personagens. Ao final, aquela fotografia que representa tanto para Antonia passa também a representar para nós, pelo poder das memórias registradas e compartilhadas. Da capa às últimas páginas, este é um quadrinho impecável.