O Abismo do Esquecimento

7 junho 2024

De Paco Roca e Rodrigo Terrasa
296 páginas
Devir | 2024
Tradução: Jana Bianchi

O tema central da obra de Paco Roca é, sem dúvidas, a memória. Não é diferente em O Abismo do Esquecimento, seu último quadrinho, uma colaboração com o jornalista Rodrigo Terrasa. Juntos, eles retratam a luta de Pepica Celda, uma idosa de mais de oitenta anos, para recuperar os restos mortais de seu pai, José Celda, fuzilado durante a ditadura franquista e enterrado em uma vala comum, ao lado de centenas de outros homens como ele.

“A democracia foi cimentada sobre o esquecimento”, diz o quadrinho. Demorou muito para que Pepica conseguisse a exumação da vala de número 126, no cemitério de Paterna. O Estado espanhol, mesmo após o fim do regime de Franco, não tinha interesse em mexer no passado. No quadrinho, Roca e Terrasa entrelaçam histórias e tempos, além de inserirem respiros no curso da trama para trazer explicações e contexto. Algo muito semelhante ao que o quadrinista já havia feito em Regresso ao Éden.

O resultado é uma HQ emocionante por seu realismo e principalmente pelas escolhas de como encadear os relatos. A construção visual de O Abismo do Esquecimento mantém as características de outras obras de Paco Roca, com destaque para a fluidez narrativa que vem de um perfeito uso da quadrinização das histórias colhidas pela dupla de autores.

Ao longo das páginas é recorrente a menção ao coveiro do cemitério de Paterna… até que ele é interligado ao todo. O Abismo do Esquecimento ganha ainda mais força quando somos apresentados Leoncio Badía, um homem que lutou pela República e que para sobreviver ao franquismo precisou “enterrar os seus”. O coveiro guardava para os familiares pedaços de roupa e mechas de cabelo dos homens assassinados e fez o possível para catalogar centenas de corpos, para quando eles pudessem, enfim, ser retirados dali no futuro. Um futuro que levou muito tempo, mas chegou.

O Abismo do Esquecimento é uma história espanhola, mas poderia também ser uma história ambientada em tantos outros países que conviveram com o fascismo, com as ditaduras. Pode parecer comum dizer que é necessário não esquecer o passado, mas não é a primeira vez que Paco Roca nos mostra o poder da memória.

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