Conhecido por seu olhar crítico e irônico sobre as questões sociais e políticas do Brasil, na virada do século, o escritor Lima Barreto ganhará uma nova adaptação em quadrinhos. Em dezembro, a editora Via Lúdica publica uma releitura de “O Homem que Sabia Javanês” feita por Davi Calil. A HQ do autor de “Uma Noite em L’Enfer” e da série “Kung Fu Ganja” é o pontapé inicial da Coleção Clássicos ao Quadrado, um projeto que trará outros grandes nomes do quadrinho brasileiro adaptando literatura.
Versões em quadrinhos de livros clássicos não são novidade no cenário brasileiro. No entanto, a proposta da coleção, comandada pela editora Luara Almeida, é mais ousada: dar liberdade para as intervenções dos quadrinistas. “Eu não queria fazer uma adaptação totalmente literal, principalmente, não queria ser obrigado a usar o texto na íntegra, gostaria de valorizar a linguagem dos quadrinhos deixando as imagens contarem a história junto com o texto, para que não fossem redundantes ou meramente ilustrativas. Foi uma grata surpresa descobrir que a Luara também tinha isso em mente”, conta Davi Calil em entrevista ao Fora do Plástico.
Publicado originalmente em 1911, “O Homem que Sabia Javanês” é um dos contos mais célebres de Lima Barreto. A obra acompanha Castelo, um vigarista que finge ser especialista em javanês, língua falada da Ilha da Java, para impressionar autoridades e ascender socialmente. A adaptação de Calil mantém todo o conceito da obra, porém faz algumas alterações para que o original funcione também como quadrinho. “Foi preciso estender cenas, substituir algumas palavras e criar diálogos para que se tornasse uma leitura de HQ agradável”, explica.
Outra mudança importante, e ousada, foi adicionada pelo artista: o próprio Lima Barreto como personagem do quadrinho. “Decidimos que o Prólogo e o Epílogo seriam feitos em quadrinhos (pintados em guache) e protagonizados pelo Lima Barreto, é quase como se ele surgisse para comentar o próprio conto, trazendo um tom mais crítico e melancólico para gerar uma reflexão que vai além do humor originalmente contido na obra”, revela o autor.
Cofira abaixo algumas páginas do quadrinho, com exclusividade.
Apesar de já ter lido “O Triste Fim de Policarpo Quaresma”, foi após o convite da Via Lúdica que Davi Calil mergulhou na obra e principalmente na biografia de Lima Barreto. “Li e reli o conto a ser adaptado umas 100 vezes (sem exagero) é bem curto, mas é incrível, cada palavra carrega um significado enorme, Lima Barreto foi um escritor genial“. O quadrinista destaca a capacidade de construção de personagens do escritor, algo evidente no conto adaptado. “Os diálogos são riquíssimos, o humor e a crítica social andam lado a lado deixando a gente na dúvida se deveria torcer a favor ou contra Castelo, nosso protagonista”.
Parte do grupo editorial paulista Multiverso das Letras, a Via Lúdica é uma editora focada em literatura infantil, embora não se limite à infância nem à literatura. A Coleção Clássicos ao Quadrado é uma de suas primeiras incursões nos quadrinhos, após o lançamento da HQ “Corre Cutia”, de Daniel Mallzhen. A editora revelará ao longo dos próximos meses outros quadrinistas que integrarão a coleção e suas respectivas adaptações.