O Golden Comic Awards, prêmio de quadrinhos realizado pelo Ministério da Cultura de Taiwan, teve um brasileiro como vencedor na categoria “Quadrinho do Ano”. O baiano Lucas Paixão, que vive em Taiwan desde 2014, foi premiado por “Sexland Adventures”, uma coletânea de nove contos eróticos ainda inédita no Brasil.
Na cerimônia de premiação, realizada na semana passada, Lucas disse que “se sente oficialmente um quadrinista de Taiwan”. Apesar de publicar em editoras locais, o artista conta ao Fora do Plástico que, em 2020, não pôde concorrer ao mesmo prêmio com outro trabalho, “A Garota da Noz”, por ser estrangeiro. “No ano seguinte o prêmio mudou as regras, o que é incrível, mas infelizmente o livro não pôde mais concorrer”, explica Lucas.
Apesar das antigas regras do Golden Comic Awards, o artista ressalta que os taiwaneses são muito receptivos com estrangeiros. “No começo queria que focassem nos quadrinhos, então não mostrava a cara, e nem dizia que não era daqui, mas depois reparei que deixando isso claro, acaba sendo um chamariz para que se interessem pelos meus quadrinhos, e sendo esse meu principal objetivo, tento aproveitar ao máximo”, revela.
Aproveitar de sua formação como brasileiro, seja com o senso de humor baiano ou até mesmo com referências das novelas que cresceu “assistindo por osmose”, é uma maneira de Lucas apresentar aos taiwaneses um pouco do lugar de onde veio. Em “A Garota da Noz”, que será lançada no Brasil pela NewPOP, o protagonista é brasileiro, o que levou o quadrinista a “apresentar várias coisas específicas para o público”. Já “Sexland adventures”, tem duas das nove histórias ambientadas em Salvador, com páginas repletas das paisagens que faziam parte do cotidiano do quadrinista.
Ingressar no mercado de quadrinhos taiwanês foi, para Lucas, a retomada de um sonho. “Desde pequeno sempre gostei de desenhar quadrinhos, mas nunca pensei em ir atrás deste sonho, pois nunca tive nenhuma referência. Prestei vestibular para design gráfico porque pelo menos tinha ‘algo a ver’, e trabalhei na área por 5 anos”. Já vivendo em Taipei, para fazer um mestrado em Artes, o brasileiro se deparou com um evento de “Dōjinshi”— feira de artistas independentes, com publicações autorais. “Isso me inspirou muito, pois não sabia que tinha tanta gente desenhando quadrinho aqui”, conta Lucas. Depois, o artista participou de um concurso de quadrinhos, que viu em um cartaz na universidade. “Foi assim que consegui entrar no mercado, com um ‘Prêmio Potencial’, fui chamado para serializar semanalmente no aplicativo de webtoons ‘Comico’, onde estreei minha primeira HQ, ‘A Garota da Noz’, em 2016″, explica.
Antes mesmo de vencer o Golden Comic Awards, Lucas já era um “quadrinista de Taiwan”, tanto que foi inserido no pavilhão do país no Festival de Angoulême deste ano. Porém, vencer uma premiação como essa é a validação de um trabalho de anos, como o artista expressou em entrevista. Seu jeito de mesclar a cultura, as cores e influências do país que o acolheu com as heranças que carrega do Brasil são um belo exemplo de soft-power brasileiro. “Acho que essas nuances regionais, quando aparecem de forma natural faz com que os leitores locais sintam uma aproximação (na minha opinião até romântica), e para os leitores internacionais é como se a obra tivesse uma camada a mais para explorar”. Os jurados da principal premiação de quadrinhos taiwanesa concordam.