
Em 2014 a associação Estados Gerais dos Quadrinhos (EGBD, na sigla em francês), propôs uma pesquisa para entender a realidade das autoras e autores de quadrinhos das mais diversas áreas, na França. Um dos principais motivos para a sua realização eram os relatos da precarização da qualidade de trabalho e da queda da renda mensal dos artistas. Assim, em 2015, foi feito o estudo com os quadrinistas profissionais e amadores do país para entender esse cenário. Agora, dez anos depois, a EGBD fará uma nova pesquisa com os profissionais da área.
O objetivo do novo levantamento é entender o que mudou desde a última coleta de informações. Os dados de 2015 mostram uma classe precarizada com profissionais qualificados, porém com incertezas sobre o seu futuro na profissão e seus rendimentos, além de poucos ou nenhum direito trabalhista. De acordo com os resultados da pesquisa anterior, o resultado mostra as instabilidades do mercado, já que mesmo em um mercado de quadrinhos maduro como o francês, os artistas passam por muitas dificuldades.
A pesquisa está disponível para artistas de todas as áreas de atuação: desenho, roteiro, cor, storyboard, seja dos formatos tradicionais, quanto dos webtoons que vêm ganhando espaço no mercado francês. A pesquisa é feita de forma anônima por um formulário que ficará disponível até a meia-noite de 19 de outubro. A expectativa é que os resultados preliminares sejam divulgados no Festival Internacional de Quadrinhos de Angoulême, em janeiro de 2026.

Sobre a pesquisa de 2015
Um relatório da pesquisa de 2015 feito pelo site La Cité internationale de la bande dessinée, trouxe alguns relatos de quadrinistas. Uma autora revelou um quadro de sua situação à época. Ela disse que quatro anos antes da pesquisa se considerava uma profissional da área, mas já em 2015, se descrevia com uma profissional precarizada. Para contornar a situação, ainda segundo a autora, muitos jovens acabam por se tornar profissionais versáteis e vão mudando de área: quadrinhos, animação, storyboard, etc.
Um artista pontuou, à época, que ganhava cerca de 70 a 80 euros por página, e que gastava de 10 à 12 horas por página, tornando assim o salário muito baixo. Uma outra quadrinista destaca que o dinheiro do adiantamento dura apenas para o processo de produção e que, depois das páginas entregues, ela precisa “se virar”.
Confira alguns dados levantados pela instituição em 2015:
– Profissão precária: os autores entrevistados se definem em 15% como amadores, 53% como profissionais precários e 32% como profissionais estabelecidos.
– Feminização crescente: 27% das respostas vieram de mulheres, bem mais que os 12% geralmente mencionados.
– Profissão jovem: 56% dos autores entrevistados têm menos de 40 anos. A média de idade das mulheres é de 34 anos, a dos homens de 41 anos.
– Nível de formação elevado: 79% dos autores fizeram ensino superior, a grande maioria na área artística.
– Trabalho exigente: 36% trabalham mais de 40 horas por semana. E para 80%, o trabalho invade ao menos dois fins de semana por mês.
– Rendimentos medíocres: em 2014, 53% dos respondentes tiveram uma renda inferior ao salário mínimo anual bruto (SMIC), sendo que 36% estavam abaixo da linha da pobreza. A situação é ainda pior quando se consideram apenas as mulheres.
– Proteção social fraca: 88% dos profissionais entrevistados nunca tiveram direito a licença médica, 81% nunca se beneficiaram de licença maternidade, paternidade ou adoção.
– Futuro incerto: 66% dos autores entrevistados acham que sua situação vai se degradar nos próximos anos.
(Tópicos retirados do site La Cité internationale de la bande dessinée)
Pesquisa no Brasil
Uma parceria entre a Quadrinhopédia, o Comitê Nacional de Quadrinhos e o coletivo Quadrinistas Uni-vos realizou o “Censo Nacional dos Profissionais de Quadrinhos e Humor Gráfico”. O objetivo era mapear os profissionais da área de quadrinhos e humor gráfico no país.
Assim como a iniciativa francesa, a pesquisa busca identificar as demandas da classe e como melhorar o reconhecimento dos profissionais. Vale destacar a abordagem ampla da pesquisa, que não focou apenas nos profissionais que vivem de quadrinhos, mas em artistas que fazem HQs sem retorno financeiro. A previsão é que os dados da pesquisa sejam lançados entre setembro e outubro.