De Luckas Iohanathan
100 páginas
Pipoca & Nanquim | 2023
Ninguém está preparado para o que vai encontrar em O Monstro Debaixo da Minha Cama, publicado pela Pipoca & Nanquim. Mesmo que saiba o que esperar, a leitura ainda é um golpe. Um baque. Porque, como o autor Luckas Iohanathan alerta na primeira página, “esta é uma obra de ficção, a realidade é bem pior”.
Dia após dia, Lucy é abusada pelo próprio pai. Sua mãe sabe o que acontece no quarto da menina, mas não consegue proteger a filha ou enfrentar o marido. Assistimos nossa pequena protagonista se tornar uma criança que tem problemas na escola, é agressiva em alguns momentos, e se sente completamente sozinha.
Lucy nunca enxerga seu pai como figura paterna. Ele é, o tempo todo, um monstro. Os garotos da escola? Monstros. Todos os homens adultos também são. Seus traumas estão refletidos em cada comportamento e a sensação de impotência é um incômodo constante durante a leitura. Inevitável lembrar de Gato Fernández e seu O Golpe de Barata, que aborda o mesmo assunto.
Luckas Iohanathan usa elementos lúdicos, como os brinquedos de Lucy, para desenvolver os sentimentos da garota. Além de trazer metáforas visuais, entre outros recursos, para que as situações retratadas sejam expostas de forma sensível. Mas sem jamais suavizar a gravidade do que acontece.
Para isso, o quadrinista conta com uma arte dinâmica, com um belo uso do rosa, em diferentes intensidades, sempre em contraste com o preto que também domina as páginas. Destaque para o aspecto sujo que alguns quadros ganham, após a presença do monstro.
O amargor causado por O Monstro Debaixo da Minha Cama é também um sinal de nossa apatia social diante dos abusos sexuais infantis intrafamiliares, que ainda soam como um grande tabu. Mesmo que o autor esteja retratando uma realidade que não a sua, a necessidade de pautar o assunto se mantém. É preciso se incomodar, como essa HQ nos faz sentir.