De Manu Larcenet
252 páginas
Pipoca & Nanquim | 2023
Tradução: Fernando Paz
“Quando não é horrível, a vida é magnífica”… E é justamente sobre a vida que Manu Larcenet se debruça em seu O Combate Cotidiano, HQ recém-lançada no Brasil pela Pipoca & Nanquim. O protagonista, Marco, é um sujeitinho complexo, difícil de descrever com algumas poucas palavras. O que sabemos dele, logo nas primeiras páginas, é que cansou de retratar o caos da guerra em suas fotografias. Resolveu, então, se mudar para uma casa no campo e encarar uma rotina menos agitada.
Seguro de si, mas ao mesmo tempo infantil para encarar determinadas situações, Marco é o centro dos quatro volumes compilados neste integral de O Combate Cotidiano. Seu olhar para o mundo é ora pessimista, ora tragicômico e ele não está sozinho. Larcenet compõe uma orquestra de personagens dissonantes, como só gente de verdade poderia ser. Seu irmão, seus pais, a veterinária Émile, o terapeuta, um vizinho solitário… Marco precisa lidar com todos e consigo mesmo, com sua ansiedade e convicções pessoais.
Apesar da capa idílica, a vida aqui não é romantizada. Ela tem altos e baixos, em uma visão realista das relações pessoais, que se transformam e ganham outras perspectivas. Larcenet organiza um roteiro sustentado pelos ótimos diálogos, em que os personagens vão sendo desenvolvidos e complexificados à medida que temos mais contato com eles. Nada é explicativo demais e quando nos damos conta, entendemos que o título é perfeito para essa história.
Se engana quem pensa que para falar de temas complexos é necessário uma arte realista. O autor prova exatamente o contrário com seu traço caricato, que também se modifica ao longo dos capítulos, sem perder suas características. A única exceção são poucas páginas em preto em branco, como se reproduzissem as fotos de Marco, enquanto ele faz reflexões.
O Combate Cotidiano é uma leitura sublime. Ao mergulhar no cotidiano, o quadrinho toca em muitos temas que não se esgotam e que nos afetam, cada um ao seu modo. É difícil não se render ao humor de Marco, ao carisma de Émile, à energia de Pablo ou à sabedoria agridoce da mãe do protagonista. E quando fechamos as páginas, o nosso olhar para o que está ao redor já não é mais o mesmo.