De Marcelo D’Salete
144 páginas
Veneta | 2023
Primeiro livro de Marcelo D’Salete, Noite Luz já apresenta muito daquilo que o autor de Encruzilhada, Cumbe, Angola Janga e Mukanda Tiodora viria a apresentar nessas obras. Ao mesmo tempo, as histórias que formam esse primeiro trabalho também são evidências de um artista em formação, em busca de experimentar e se desenvolver como um narrador gráfico.
Mesmo que não sejam contínuas, as seis tramas apresentadas se relacionam de alguma maneira. Todas elas são ambientadas nos arredores da casa noturna Noite Luz. Seus personagens incluem catadores, desempregados, mulheres em busca de sustento para si e para os outros, meninos de rua, seguranças… D’Salete escreve personagens realistas, embora tenham pouco espaço para mostrar mais de si.
Um cenário tão urbano, com histórias também tão urbanas não poderia deixar de nos remeter ao Chapa Quente, de André Kitagawa. Os dois projetos compartilham a crueza como tudo é levado para a página, a predileção pelas histórias à margem. É possível notar que a experimentação de D’Salete se dá não só no traço, mais diferente daquele que o consolidou, mas também em termos narrativos. Nem tudo funciona com clareza, algumas sequências podem parecer confusas e alguns desfechos anti-climáticos, diante da história já apresentada.
Ainda sobre o visual urbano, há muito do que o próprio autor observou no período em que foi office boy no centro de São Paulo, como conta em entrevista nos extras. A representação dos ambientes e personagens é apurada, instigante, e o uso do contraste já demonstra um pouco do que veríamos em suas obras futuras.
A republicação de Noite Luz pela Veneta é um registro das origens de Marcelo D’Salete. É importante ter isso em perspectiva ao adentrar a leitura. É claro que veremos as arestas de um trabalho em formação, mas também a qualidade notável de um dos maiores quadrinistas brasileiros.