De Tiago Holsi
64 páginas
MMarte | 2022
Espinhela Caída é como um diário. Tiago Holsi expõe, com muita sinceridade, a forma como seu processo criativo foi impactado pelo isolamento durante a pandemia. Mais do que um “quadrinho pandêmico”, o resultado final é uma reflexão intimista sobre o desafio que é produzir quadrinhos.
A partir de uma narrativa fluida, Tiago encaixa um pouco de tudo o que o afeta ao “ser quadrinista”. Medo, síndrome do impostor, cobranças, desgaste físico, desestabilidade financeira… Pode parecer uma visão pessimista, mas o autor faz notável o quanto a produtividade de um artista é afetada pelo ambiente em sua volta. E a pandemia foi o ambiente ideal para ansiedades e inseguranças, principalmente com a chegada de sua segunda filha. Encadeando situações tragicômicas com reflexões que desnudam seus sentimentos, o quadrinista torna nossa empatia quase imediata. Quadrinhos que abordam o ofício são ótimos para pensarmos sobre aquilo que compõe a vida de quem está por trás das páginas que lemos.
O título Espinhela Caída carrega ainda uma história bem interiorana e que se encaixa com o objetivo da HQ. Quando menino, Tiago foi “diagnosticado” com espinhela caída e precisou dos serviços da benzedeira Dona Cotinha, a mais famosa da cidade. Esse olhar para o passado faz parte do fluxo de pensamento desordenado que rege o quadrinho. É uma narrativa desorganizada, mas que sempre se mantém coerente e bem narrada. Como se o próprio autor decidisse nos contar, em uma conversa franca e um tanto aleatória, aquilo que precisava tirar de dentro de si.
A arte traz boas sacadas visuais, como o criativo “jogo do burnout”, que não funciona apenas para quadrinistas, mas para qualquer trabalhador com um modelo extenuante de trabalho. O uso do esqueleto para se representar na HQ se enlaça com a proposta do título e traz um quê existencialista, que não deixa de ser divertido.
Publicado de forma independente, com parceria da editora MMarte, Espinhela Caída é uma autobiografia que, como as boas autobiografias, se centra no fator humano. O olhar de Tiago para si mesmo; para os efeitos da pandemia; para o trabalho e para aquilo que o motiva a fazer quadrinhos é muito honesto.