De Junji Ito (Baseado na obra de Osamu Dazai)
616 páginas
JBC | 2023
Tradução: Lucas Cabral
A adaptação de Junji Ito para Declínio de Um Homem, de Osamu Dazai, é na mesma proporção original e fiel à proposta niilista do escritor. A trajetória destrutiva do protagonista Yozo Ohba é retratada de maneira intensa, enquanto Ito transforma as 140 páginas de um dos livros mais populares da literatura japonesa, em um mangá de mais de 600.
Desde a infância de Ohba, sua vida foi marcada por uma sensação constante de deslocamento, como se sua existência fosse um fardo. Ele se torna um homem assombrado pelos fantasmas da culpa, com comportamentos que resultam em tragédias para as pessoas que o cercam, sobretudo mulheres. Depressão e vícios se misturam, desencadeando no protagonista reações cada vez mais nocivas em seu corpo e mente. Não importa onde ele tenta ancorar, haverá frustração e novas cicatrizes.
Pela natureza da narração pessimista do próprio Ohba, é inevitável que essa seja uma leitura incômoda. As situações retratadas não aliviam a tensão e Junji Ito sabe muito bem como transformar as lutas emocionais do personagem em um horror psicológico que beira o sobrenatural. É interessante notar como esse horror se torna cada vez mais presente, no traço e nas situações, à medida que a história avança. Outro ponto notável é como o mangaká relaciona sua adaptação à vida de Osamu Dazai, afinal, uma das marcas de Declínio de Um Homem são as conexões entre a obra e a biografia do autor.
Muitas vezes é possível notar que Junji Ito quer materializar para o leitor a angústia de Yozo Ohba e usa vários recursos para isso. Há cenas chocantes e imagens grotescas, mas nada soa forçado naquele contexto, em que o tormento é uma constante. Nas mãos de Junji Ito o livro de Dazai assombra pela crueza da decadência do protagonista e de tudo ao seu redor.
Não é de se esperar que Junji Ito tenha medo de chocar seus leitores. A adaptação de Declínio de Um Homem, publicada no Brasil pela JBC, traz para as páginas os fantasmas mais obscuros do interior humano, sem deixar de reverenciar, ainda que de forma melancólica, a complexidade da vida e obra de Dazai.